Edição 97 ● Setembro de 2020
Documentário sobre prisão de Caetano Veloso mostra o poder dos arquivos
Estreou no último dia 7, em Veneza, o documentário Narciso em férias, que narra a prisão do cantor e compositor Caetano Veloso pela ditadura brasileira, em 1969. O filme foi coproduzido pela Uns Produções e pela Videofilmes, com direção de Renato Terra e Ricardo Calil. No Brasil, a produção está sendo distribuída, via streaming, pela Globoplay.
A obra, narrada em primeira pessoa pelo próprio Caetano, é simples e ao mesmo tempo comovente. Além de expor toda a insânia em torno de sua prisão – fora de quaisquer parâmetros minimamente aceitáveis, algo comum naquele Brasil pós-AI-5 –, o documentário aborda a face mais nefasta da burocracia aliada ao regime repressor.
Na metade final do filme, Caetano Veloso se reencontra com o dossiê de 330 páginas produzido pelos órgãos de segurança da ditadura e hoje custodiado pelo Arquivo Nacional. A documentação foi abordada em detalhes pelo jornal El País e mostra invencionices sobre a vida e a obra de Caetano, além de ser versada em uma linguagem tão precária, quanto farta em adjetivos depreciativos.
Para que se tenha uma ideia, um dos pontos de partida que levaram à prisão de Veloso seria a canção Che, lançada pelo cantor em homenagem ao guerrilheiro Ernesto Guevara, em um disco de 1968. Acontece que a música nunca existiu, como também não existiram e nem puderam ser comprovadas as acusações de que o baiano teria parodiado o Hino Nacional em um show, naquele mesmo ano.
Caetano Veloso ficou preso por 56 dias, parte deles em uma solitária, incomunicável e sem saber o motivo de sua detenção. Na prisão, ouviu gritos de possíveis torturados, teve seus cabelos cortados e foi proibido de ver seus familiares. Solto, foi levado a Salvador e de lá foi proibido de sair, apesar de morar em São Paulo. Em julho de 1969, depois de vários meses proibidos de dar declarações ou entrevistas, Veloso e sua esposa partiram para o exílio, na Inglaterra. Gilberto Gil, preso e solto junto com o parceiro, também foi embora do país. Estimativas recentes dão conta de que pode ter chegado a 10 mil o número de brasileiros exilados na última ditadura. Documentos revelados há pouco mostram que até 20 mil pessoas podem ter sido presas pelo regime.
Em janeiro de 1972, Caetano Veloso retornou definitivamente ao Brasil. Só em março de 1985, a ditadura começou a dar lugar à frágil democracia brasileira.
Brasil
Todas as postagens em redes sociais, sítios e portais vinculados à Secretaria Especial da Cultura passarão por censura prévia, determinada pelo próprio secretário, o ator Mario Frias. No grupo de instituições estão o Iphan e a Casa de Rui Barbosa.
Por falar em Casa de Rui Barbosa, a audiência promovida pela Câmara sobre a situação da instituição foi marcada por choro e protestos da presidente da instituição, Leticia Dornelles. A atriz defendeu o presidente Jair Bolsonaro, pediu mais verbas ao Congresso e se defendeu das acusações de que estaria perseguindo pesquisadores.
O Itamaraty classificou como "reservados" os telegramas com instruções repassadas aos diplomatas brasileiros em votações na ONU de temas relacionados à discriminação e violência contra mulheres. O material só poderá ser consultado daqui meia década.
A CGU lançou a 4ª versão atualizada da cartilha Aplicação da Lei de Acesso à Informação na Administração Pública Federal. Confira!
Estão abertas as inscrições para o V Simpósio Arquivos & Educação e IV Seminário Internacional Memórias, Narrativas e Arquivos. Os eventos ocorrerão entre 21 e 23 de outubro de 2020, via YouTube. As inscrições terminam em 20 de outubro.
Seguem abertas até o próximo dia 20 as inscrições para comunicações no VII Seminário Regional de Arquivos, promovido pela Associação dos Arquivistas do Estado do Rio Grande do Sul. O evento acontece nos dias 16 e 17 de outubro.
A recém-criada Rede de Pesquisa em Acervos e Patrimônio Cultural (REPAC), vinculada ao Núcleo de Estudos de Memória e Cultura da Universidade de Passo Fundo (RS) promove seu primeiro encontro na próxima sexta, dia 18. Não perca!
Mundo
O The Wall Street Journal divulgou que a China está trabalhando intensamente em uma nova norma de segurança de dados na rede. A iniciativa é parte da guerra silenciosa que a potência trava com os Estados Unidos.
No México, um documento sobre Hernán Cortés, roubado do Archivo General de la Nación, está sendo vendido nos Estados Unidos.
Aliás, nos Estados Unidos arquivistas estabeleceram uma verdadeira briga para seguir salvaguardando e oferecendo acesso aos chamados abandonware, principalmente jogos on-line.
O Anuario da Escuela de Archivología de Córdoba está divulgando o edital de submissão de artigos para seu próximo número. Confira!
E vem aí o I Encuentro Pan Andino de Associaciones de Archiveros y Archiveras. O evento ocorre no próximo dia 25 de setembro.
Para ler com calma
A Carta de Ouro Preto 2020, sobre a preservação do patrimônio audiovisual brasileiro (via Prodview).
"Un archivo para la Historia", sobre o acervo pessoal do ditador espanhol Francisco Franco (em espanhol, via La Razón).
E um brilhante texto de Marcello Dantas, sobre o envio do acervo do arquiteto brasileiro Paulo Mendes da Rocha para Portugal (via Gama).
Para ver com calma
O bate-papo Arquivologia UFSC: 10 anos de ensino em 2020 (via Arquivologia UFSC).
A palestra "Desafios da gestão documental em tempos de pandemia", com Maria Teresa Bermúdez Muñoz (em espanhol, via Archivo Nacional de Costa Rica).
E os mais recentes Diálogos, promovidos pelo curso de Arquivologia da FURG, com Paulo Elian e Moises Rockembach.