Ano V ● Edição 215 ● Fevereiro de 2023
O Giro da Arquivo daquela semana já havia chegado às caixas de e-mail de nossos assinantes quando recebemos a confirmação de uma notícia que, dias antes, havíamos começado a investigar: de acordo com informações enviadas por fontes anôminas, funcionários do Arquivo Nacional estavam sendo obrigados a obedecer uma decisão judicial que mandava “anonimizar” documentos da Comissão Nacional da Verdade.
No dia seguinte, 2 de fevereiro de 2022, publicamos uma edição extra com detalhes sobre a história. Um processo judicial movido pelos familiares de Olinto de Souza Ferraz, ex-coronel da Polícia Militar de Pernambuco, havia resultado na ordem de censurar todas as menções ao policial constantes no relatório final da Comissão Nacional da Verdade – ao menos nos documentos disponibilizados pelo Arquivo Nacional, via SIAN.
O caso repercutiu amplamente. Foi manchete dos principais jornais e portais de Internet do país, além de ter virado notícia internacional. A história também provocou o repúdio público de entidades, como o Fórum Nacional das Associações de Arquivologia do Brasil (FNArq).
Poucos dias depois, no entanto, publicamos outra investigação, desta vez ainda mais grave. Nela, contamos a história de um processo aberto pela família do ex-governador Ney Braga, causa em que uma decisão judicial ordenou que fossem suprimidos e até incluídos novos documentos no relatório final da Comissão Estadual da Verdade do Paraná.
Apesar da gravidade dos casos, um ano depois as decisões judiciais seguem sendo cumpridas sem contestação. O Governo Federal, a quem caberia defender a ampla publicização dos relatórios das comissões da verdade, até hoje não agiu para derrubar a censura imposta aos documentos.
No último dia 03 de janeiro, o recém empossado ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, fez um eloquente discurso em defesa da verdade e da memória. Caberá a ele, à nova direção do Arquivo Nacional e ao novo governo como um todo enfrentar o desafio de cooperar para o resgate destes dois pilares da democracia também por intermédio do fim da censura aos documentos que fazem parte da História do país. Uma missão difícil, mas urgente para o Brasil.
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Brasil
Por falar em Arquivo Nacional, a instituição segue em pauta – e por motivos bem pouco nobres. As chuvas que caíram no Rio de Janeiro, na semana passada, provocaram alagamentos em alguns dos principais depósitos da instituição. De acordo com a direção do AN, nenhum item do acervo foi perdido.
Outra instituição que também segue na pauta é o Arquivo Público Estadual de Pernambuco. Além de ninguém saber ao certo se o órgão está funcionando ou não, a seção pernambucana da Associação Nacional de História (ANPUH) manifestou preocupação com as condições do APEJE. As fotos publicadas pela ANPUH mostram que a infraestrutura da instituição está bastante comprometida.
A revista Acervo lançou chamada de artigos sobre acervos privados. O dossiê “Memória e história: potências e tensões nos usos de acervos privados” receberá contribuições até o próximo dia 28 de julho.
O Ministério da Cultura vai repassar R$ 8 milhões à Cinemateca Brasileira. O anúncio foi feito na semana passada, pelo secretário-executivo da pasta. A instituição, cabe lembrar, passou por um longo período de abandono e ataques nos últimos anos.
O Fórum de Entidades em Defesa do Patrimônio Cultural Brasileiro lançou um relatório intitulado “Em Defesa do Patrimônio Cultural: percursos e desafios”. O documento é fruto de um seminário de mesmo nome, realizado em 2021.
O Museu Municipal Carmen Miranda, de Marco de Canaveses (cidade portuguesa em que a estrela brasileira nasceu), quer levar parte ou até todo o acervo da cantora que está no Brasil. A oferta é de que sejam realizadas intervenções nos documentos, além de réplicas e, eventualmente uma “cedência” do acervo. Os portugueses parecem estar mais atentos ao que é nosso do que nós mesmos…
Agenda: o início de março será marcado por dois eventos realizados no Ceará. Entre os dias 01 e 04, acontece o II Encontro de Arquivo Públicos e Privados do Estado do Ceará (com transmissão via Internet); já entre os dias 6 e 10 de março, é a vez do II CIPAPEC – Círculo de Palestras do Arquivo Público do Estado do Ceará, este ano com a temática “A violência contra mulheres e a inclusão social”.
Oportunidades: tem concurso com vagas para arquivista na prefeitura de Vera Cruz do Oeste (PR); e para estagiários na área em Santa Maria (RS) e Araucária (PR). Para quem procura qualificação, estão abertas as inscrições para a Pós-Graduação em Gestão Arquivística de Informação e Dados, da FESPSP.
Mundo
A Família Real britânica quer contratar três arquivistas para cuidar da documentação da rainha Elizabeth II (1926-2022). Os salários poderão chegar ao equivalente a R$ 200 mil.
Não é no Brasil, mas como é bom ver um arquivo receber investimento em infraestrutura. O município de Marinha Grande, em Portugal, acaba de reinaugurar a sede do Arquivo Municipal – que foi requalificado a partir de um investimento de 226 mil euros. Ficou bonito.
Só que lá na Europa, como cá, nem tudo é belo. A cidade espanhola de Villena completou um ano sem seu arquivo municipal – que foi trasladado para Alicante por conta da prometida (e não cumprida) realocação do arquivo para um edifício adequado.
A ALA publicou um importante pronunciamento sobre a destruição e o risco sofrido pelos arquivos no contexto dos protestos sociais na América Latina. O documento clama para que sejam implementadas medidas que assegurem o resguardo e a proteção das informações custodiadas nos arquivos da região.
E, na Argentina, a Secretaria de Direitos Humanos apresentou um Mapa da Memória do Holocausto sobre arquivos e lugares dedicados ao tema.
Para ler com calma
Arquivo da Infância e Juventude faz mais de uma década e atua no acesso a informações de adotados sobre sua origem (via TJPE).
Identidade e memória: 40 anos apoiando aos arquivos municipais (em espanhol, via Heraldo)
Morto há 50 anos, Pixinguinha revive com registro fonográfico de 50 músicas inéditas em disco (via G1).
Para ver com calma