Edição 61 ● Janeiro de 2020
Os arquivos e a Arquivologia em 2020
Depois de um 2019 difícil, cheio de perdas e com significativos retrocessos, a Arquivologia brasileira deve ter um 2020 repleto de definições importantes. No âmbito público, preocupam os ataques à legislação, sobretudo no que diz respeito à gestão, ao acesso e à privacidade, atingidas em grande parte pela sanha governamental de impulsionar a digitalização como solução para os problemas arquivísticos brasileiros. A mobilização da área, as dificuldades técnicas proporcionadas pela nova legislação e a insegurança jurídica dela proveniente podem ser meios de reduzir possíveis danos causados por mudanças abruptas, como as observadas no ano anterior. Tudo isso dependerá, no entanto, de uma conjunção de fatores difíceis de precisar. A situação preocupa.
Igualmente inquietante é também o rumo de alguns dos novos diretores de instituições vinculadas ao patrimônio cultural arquivístico brasileiro. Nas primeiras semanas deste ano, os jornais voltaram a falar do desmonte na Fundação Casa de Rui Barbosa, dirigida por Letícia Dornelles, que exonerou o principal núcleo de pesquisadores da instituição. A diretora não explicou as demissões, mas afirmou se tratarem de "uma otimização administrativa". O Globo anunciou nesta semana que, ainda na Casa Rui, ocorrerão "homenagens" aos ícones neoliberais Ronald Reagan e Margareth Thatcher, um projeto desenvolvido pela própria diretora do órgão.
Do ponto de vista da Arquivologia, segue pendente de definição o futuro do registro profissional de arquivistas, cuja obrigatoriedade foi derrubada pela Medida Provisória Nº 905/2019, editada pelo presidente Jair Bolsonaro. Além de ser rechaçada por mais de 50 mil pessoas em consulta pública, a MP conta com quase 2 mil projetos de emenda, a maioria deles destinada a derrubar a decisão de sustar a obrigatoriedade dos registros. A decisão final sobre o texto da MP deverá sair só no final de março.
Enquanto isso, arquivistas, estudantes e professores da área esperam um ano profícuo para publicações, eventos e espaços de debate. Em 2020, vários eventos devem movimentar a cena arquivística. A expectativa maior é pelo IX Congresso Nacional de Arquivologia, que deverá acontecer em Londrina, no Paraná. Mas há também outros destaques, como o XII Encontro Latinoamericano de Bibliotecários, Arquivistas e Museólogos, previsto para ocorrer em setembro, em João Pessoa, Paraíba. Isso sem falar no XXIV Encontro Nacional de Estudantes de Arquivologia, programado para julho deste ano, no Espírito Santo.
Enfim, entre angústias e expectativas, 2020 começa repleto de desafios que só a organização e o interesse continuado da área poderão superar. No Giro, esperamos acompanhar, por mais um ano, o que é notícia no Brasil e no mundo da Arquivologia. Para isso, contamos com sua audiência qualificada, interação e apoio. Divulgue nosso trabalho. Ajude-nos a ter novos assinantes. Participe!
Brasil
Morreu no Rio de Janeiro, no último dia 03, a arquivista Marilena Leite Paes. Graduada em Biblioteconomia e Documentação no início dos anos 1970, Paes começou a trabalhar nos arquivos em 1955, ainda muito jovem, na Fundação Getúlio Vargas. Na FGV, atuou por quase 40 anos e foi diretora do Arquivo Central, vice-diretora do Instituto de Documentação e uma das idealizadoras do Sistema de Arquivos da instituição. Nos anos 1970, uniu-se ao grupo embrionário da Associação dos Arquivistas Brasileiros, organização que chegou a presidir, entre 1977 e 1979. Recebeu inúmeros prêmios, mas foi através de suas obras – em especial do manual Arquivo: teoria e prática, editado pela primeira vez em 1986 – que se deu sua maior consagração. Reimpresso e revisado mais de quinze vezes, a obra é até hoje um dos pilares da Arquivologia brasileira, sobretudo no que se refere à técnica. Profissionais e professores da área lamentaram a morte de Marilena. O Arquivo Nacional emitiu nota de reconhecimento e solidariedade.
O ano começa cheio de novas revistas na praça. A Revista do Arquivo Público do Espírito Santo chega a seu quinto número (referente ao primeiro semestre de 2019) com bonito visual e bom conteúdo. Mais voltada ao campo da informação, mas com artigos que também abordam a Arquivologia, está no ar também a nova Em Questão. Do Arquivo Nacional, o volume 33 de Acervo traz um dossiê temático sobre "Memória e legado das resistências negras". Ágora, por sua vez, chega ao seu 60º número com uma farta oferta de bons textos, mesmo caso de Informação & Informação, que completou 24 edições no último semestre, com um número especial sobre a ISKO Brasil 2019. Leitura é o que não falta para começar o ano.
O Programa de Pós-Graduação em Arquivologia da Unirio está com inscrições abertas para seu Processo Seletivo Discente 2020. Mais informações, no link.
131%. Este é o aumento registrado pelo número de metros lineares de documentos de órgãos e entidades do SIGA autorizados para eliminação pelo Arquivo Nacional, em 2019. Ao todo, foram mais de 270 milhões de documentos. Os dados estão no relatório de atividades do órgão, divulgado no final de dezembro e que aponta também um aumento de 250% no número de documentos arquivísticos digitalizados pela instituição.
Marthon Militz, aluno do curso de Arquivologia da Universidade Federal de Santa Maria, tornou-se o primeiro discente com deficiência intelectual daquela universidade a defender um trabalho de conclusão de curso. O estudante apresentou a monografia "A memória da televisão brasileira e seus arquivos audiovisuais" no início de dezembro, sob a orientação do professor Danilo Barbiero, e obteve nota máxima.
Vila Velha, tradicional município do Espírito Santo, quer criar um arquivo público municipal. As tratativas já começaram.
O programa SP Sem Papel, que visa digitalizar totalmente a tramitação burocrática do Estado de São Paulo, chegou à marca de 1,5 milhão de documentos processados digitalmente. De acordo com dados do programa, a redução de custos foi de 99%.
O Centro de Documentação Dom Helder Câmara foi assaltado no Recife. Foram roubados computadores e um data-show, mas também houve vandalismo. Os criminosos espalharam objetos e documentos retirados dos armários da instituição.
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Mundo
A revista Archivoz mudou de endereço e logotipo, mas continua com farto conteúdo trilíngue. Confira!
Por falar em revista, o Colegio Mexicano de Archivologia está prestes a lançar o décimo número de Archívese, um boletim mensal digital com notícias da Arquivologia do México.
O Conselho Internacional de Arquivos emitiu uma nota a respeito das ameaças ao patrimônio cultural do Irã. Em meio a uma crise militar que pode ter implicações internacionais, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ameaçou destruir bens culturais iranianos como forma de atingir o país. O ICA declarou "grande preocupação" com as ameaças.
Sob "nova direção", o Governo argentino está preocupado com a expansão da terceirização sobre o sistema de documentação digital do país, obra do ex-presidente Maurício Macri. Apenas uma empresa mantém o poder sobre o sistema e há risco de desproteção ao patrimônio arquivístico argentino. As informações são do canal C5N, a partir de um informe da Auditoria General de la Nación (AGN).
A propósito, uma thread do Ministério de Defensa da Argentina mostra que uma auditoria encontrou parte dos arquivos de Direitos Humanos e Direito Internacional Humanitário em péssimo estado de conservação.
O Instituto Electoral del Estado de México está trabalhando em um Programa Anual de Desarrollo Archivístico para 2020. O trabalho é parte das ações de implementação da lei de arquivos no país.
Para ler com calma
Uma crônica sobre Archivo, a intervenção feita pelo coletivo espanhol Serrucho para anunciar o espetáculo/experiência imersiva que tem gerado boa crítica.
Ainda na Espanha, uma reportagem especial de El País, sobre os segredos do Estado espanhol através de seus arquivos.
Para ver com calma
Uma edição especial do programa Terceira Via, sobre o Arquivo Público Municipal de Campos, RJ.